Wednesday, December 01, 2004

Scriptorium

Em 19## Orniciteplático, seguindo a moda da educação da altura, resolveu frequentar um curso universitário. Tinha nessa altura uns bons e tenros 18 anos, a sensação que sabia tudo e o mundo real prestes a cair-lhe em cima.

Foi morar para uma residência de estudantes com mais 47 rapazes. Regime ditatorial disfarçado com paninhos quentes, mas ludibriado com facilidade pela guerrilha intelectual da estudantada. A governanta da casa impunha uma série de regras na altura do ingresso, mas as que na realidade funcionavam eram as dos mais velhos, que com muita diplomacia, através da praxe da casa, as transmitiam aos caloiros.

Uma das primeiras a aprender era quem quisesse levar uma rapariga para o quarto tinha que deixar um lenço à porta do mesmo para não ser interrompido. Funcionava como um compromisso de cavalheiros, porque rezava o lema da casa “Um dia por mim, outro por ti”. Muitas vezes chegara à porta do quarto e encontrara o lenço e nestas alturas tinha o saco cama na sala para depois se desenrascar no quarto de um dos outros inquilinos. Muitas vezes o seu colega sofrera na pele o mesmo tratamento, e nenhum dos residentes se importava.

A sala comum era o local de convívio eclético de alunos de várias faculdades da cidade, desde a Educação Física até à Matemática, tudo se encaixava. Depois do jantar era comum a reunião para jogar póquer, a partir da meia-noite, altura em que já não havia riso de mulheres aparecerem na sala, passava-se à sessão de cinema com os grandes clássicos como “O meu cavalo eras tu”, “Lágrimas sobre o meu salpicão” ou “Ai que me rasgas”, pilares fundamentais da educação dos jovens, gentilmente cedidos por um insuspeito residente do quarto 28 que tinha uma colecção de mais de trezentos títulos sobre esta temática.

Orniciteplático achava que o facto do pornófilo da casa morar no quarto número 28, não era uma coincidência mas um facto cabalístico de registo, tanto é que na sua terra a expressão para sodomia era “vou-te ao 28”. É claro que só na cabeça dele é que a coincidência funcionava, porque para além destas nuances de cultura campónia a que só ele tinha acesso, era desencriptado pelo curso que escolhera.

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